Autor : Adilio Marcuzzo Junior
Apesar de nossa legislação aeronáutica ser baseada nos FAR (Federal Aviation Regulations ou Regulamentos Federais de Aviação) editados pela FAA (Federal Aviation Administration) ela tem características particulares que, muitas vezes, geram erros de interpretação dos textos de nossos regulamentos.
Alguns RBHA (Regulamentos Brasileiros de Homologação Aeronáutica) tiveram que ser adaptados para nossa realidade e, em alguns casos, as traduções mal realizadas geram dúvidas sobre as funções e responsabilidades de diversos profissionais quando funcionários de empresas de manutenção ou de operadores aéreos. Além disso, a formação inicial de nossos profissionais, no que diz respeito ao conhecimento de nossa regulamentação, sempre foi deficiente o que causa equívocos que até hoje encontramos nos registros de manutenção e liberação de aeronaves. Ainda necessitamos da emissão de mais IACs (Instruções de Aviação Civil) que venham corrigir e esclarecer alguns pontos contraditórios, principalmente quanto ao treinamento e funções de certos profissionais de manutenção.
Dentre estes equívocos cometidos por operadores ou empresas de manutenção estão a incorreta avaliação sobre a responsabilidade pelo controle de manutenção e a responsabilidade pela liberação de uma aeronave em condições aeronavegáveis que geram debates intermináveis e que tentarei esclarecer neste artigo.
Conforme descrito nos RBHA 91, 121 e 135, no que diz respeito à conservação e manutenção, o responsável primário pela aeronavegabilidade de uma aeronave é seu proprietário/operador :
91.403.(a) : “O proprietário ou o operador de uma aeronave é primariamente o responsável pela conservação dessa aeronave em condições aeronavegáveis, incluindo o atendimento ao RBHA 39, subparágrafo 39.13(b)(1) (informação de defeitos à ANAC)”.
135.413 (a) : “Cada detentor de certificado é primariamente responsável pela aeronavegabilidade de suas aeronaves, incluindo células, motores, hélices, rotores, equipamentos e partes, deve manter suas aeronaves de acordo com este regulamento e deve reparar os defeitos ocorridos entre as inspeções requeridas pelo RBHA 43”.
121.363 :
(a) Cada detentor de certificado é o responsável primário pela:
(1) aeronavegabilidade de seus aviões, incluindo células, motores, hélices, equipamentos e partes dos mesmos; e
(2) execução da manutenção, manutenção preventiva, modificações e reparos em seus aviões, incluindo células, motores, hélices, equipamentos normais e de emergência e partes dos mesmos, de acordo com o seu manual e com as normas dos RBHA.
Isto significa que quando a aeronave é operada conforme os RBHA 91, 121 ou 135, o operador é obrigado a realizar o controle da manutenção programada e corretiva o que, em outras palavras, significa que o operador tem que conhecer o programa de manutenção da aeronave o qual engloba :
• Tarefas de inspeções;
• Controle de componentes com vida limite, inspeções e revisões programadas;
• Cumprimento de diretrizes de aeronavegabilidade e boletins de serviço de cumprimento compulsório
No caso de uma empresa de transporte aéreo (RBHA 121 ou 135), os requisitos do RBHA 119 já prevêem a obrigatoriedade de contratação de um funcionário que irá responder pelo Controle Técnico de Manutenção (CTM) da empresa e que fará o controle da manutenção programada de cada aeronave, porém, para o operador que voa conforme o RBHA 91 não há obrigatoriedade de contratar profissional de manutenção como seu funcionário, entretanto, isto não o exime de sua responsabilidade conforme definido no RBHA 91.403.(a). Toda vez que algum item de uma aeronave fizer parte da manutenção programada, o operador é quem deverá saber qual a data, as horas totais ou ciclos totais que determinarão o deslocamento da aeronave para uma oficina para se efetuar as tarefas de manutenção que estiverem vencidas. NENHUMA OFICINA TEM A OBRIGAÇÃO DE AVISAR QUALQUER OPERADOR SOBRE O VENCIMENTO DE ITENS DE MANUTENÇÃO PROGRAMADA DE SUA AERONAVE !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Somente durante a realização de uma IAM (Inspeção Anual de Manutenção), a oficina é obrigada a fazer o levantamento do histórico de manutenção de uma aeronave para confirmar se ela cumpre todos os requisitos da regulamentação. Após a conclusão da IAM novamente é o operador que assume o controle da manutenção de sua(s) aeronave(s).
Finalizadas as tarefas de manutenção e o fechamento da ordem de serviço, toda a cópia da documentação gerada deverá ser arquivada na Seção de Registro de Manutenção (SRM) que deverá ter pastas individuais da documentação das aeronaves mantidas pela oficina.
Em uma oficina homologada conforme o RBHA 145 o inspetor designado para a ordem de serviço é o profissional responsável por atualizar o programa de manutenção de uma aeronave durante uma IAM e também por verificar novas diretrizes de aeronavegabilidade emitidas ou se as publicações técnicas e fichas de inspeção, que estão sendo usadas pela equipe, estão atualizadas conforme a lista de revisões de publicações de cada fabricante.
É muito importante que os inspetores saibam que a responsabilidade legal pela qualidade do serviço executado em uma aeronave é totalmente deles. Nenhum funcionário de uma seção de SRM tem qualquer responsabilidade legal caso algum item de manutenção programada vencido não seja incluído na ordem de serviço durante uma IAM. Por isso, é dever do inspetor conhecer os capítulos 4 e 5 dos manuais de manutenção das aeronaves e nossa legislação aeronáutica e verificar se o programa de manutenção da aeronave está sendo corretamente atualizado pela empresa onde ele exerce a função de inspetor designado. Lembrem-se que : conforme descrito no RBHA 43 o inspetor é o responsável pelo retorno ao serviço de uma aeronave e, no caso de uma IAM, isto significa confirmar que a aeronave está cumprindo todos os requisitos de aeronavegabilidade. Quanto à documentação gerada após a realização das tarefas de manutenção são os nomes e assinaturas do mecânico e do inspetor que estarão registrados nas fichas de inspeção, ordens de serviço e nos registros de cadernetas, portanto, não há vínculo do pessoal da Seção de Registro de Manutenção (SRM) com a qualidade do serviço executado ou erros em registros na documentação da aeronave.
No caso de proprietários/operadores que possuem programas de manutenção ou de inspeções aprovados a oficina deverá solicitar os manuais dos operadores que trazem as instruções para realização destas tarefas de manutenção. É responsabilidade do operador verificar se a oficina cumpriu corretamente os requisitos de seu programa de manutenção (RBHA 91.405.(b)).
Resumindo : o planejamento da manutenção e a guarda permanente da documentação de sua frota é dever do operador tendo este um departamento de CTM ou não (RBHA 91, 121 e 135), enquanto que a função da oficina é executar as tarefas de manutenção programadas ou corretivas solicitadas pelo operador e manter registros de manutenção das aeronaves de seus clientes em sua Seção de Registro de Manutenção (RBHA 145) pelo período definido em nossa legislação.